Recontando a história: Os bugres de nossa região (por Ernesto Arno Lauer) - Parte 3



Apraz-me trazer a consideração do caro leitor fatos que envolveram os bugres de nossa região. Emprego a palavra bugres, sem conotação pejorativa, simplesmente porque assim os indígenas eram chamados naquele tempo. Gostaria de iniciar o meu escrito, relatando duas tragédias com imigrantes alemães. Primeiro, registro a história de Lamberto Von Versteg, sobrenome que adotou ao aportar no Brasil, em 1858. Antes chamava-se Lamberto Von Steg, aristocrata, descendente dos Condes de Von Amerongen. Adotou este novo apelido de família por se ver privado da fortuna e do título nobiliárquico.
A Colônia de Santa Maria da Soledade, atualmente abrangendo os municípios de São Vendelino, Barão, Carlos Barbosa e Harmonia, foi fundada em 1857 pela Sociedade Montravel, Silveiro & Cia, às margens do Arroio Forromeco. Esta empresa dividiu a grande área, desde o Forromeco Superior até a região leste, montanhosa – hoje Linha Francesa, em Barão, em inúmeros lotes, aptos a serem negociados.
A administração da nova colônia ficou sob os cuidados do Major Káten, também alemão, de uma cidade ao longo do Reno. Sabendo da chegada de uma nova leva de imigrantes, o major esteve em São Leopoldo, no prédio da Feitoria Velha onde encontrou Lamberto Von Versteg. O simples primeiro contato foi o suficiente para seduzir o recém-chegado a adquirir um lote na nova colônia.
Lamberto era amante das montanhas, por isso escolheu seu lote colonial entre os morros do Diabo e da Canastra, de onde se descortinava o belo panorama do vale do Forromeco. No alto da montanha, no coração da mata virgem, constroem uma casinha e passam a cultivar uma lavoura. Depois compram uma vaca de leite, umas galinhas, porcos e aos poucos, ele e a família, vão sobrevivendo. Em poucos anos a lavoura e a criação prosperaram e a família vivia muito feliz. 
Abro um parêntesis, para contar a trajetória de Lamperto até a constituição da família e a vinda para o Brasil, mesmo que tenha que retardar a conclusão das histórias, a que me proponho. Creio que o leitor, mesmo na singeleza de uma coluna, deva conhecer um pouco mais dos protagonistas daquilo que se conta.
Pois bem, segue lá: Lamberto, ainda Von Steg, mas já despojado do título de nobreza, adoeceu severamente quando visitava a Holanda. Foi internado e no hospital conheceu a diaconisa Valfrida Bloom, que o assistia como enfermeira. Ela literalmente roubou-lhe o coração – uma verdadeira história de amor. Aceitou o convite de casamento e o enlace aconteceu não muito depois. O casal foi abençoado com dois filhos: Jakob (Jacó), nascido em 1854 e Maria Lucila, que chegou ao mundo em 1856. 
Já no Brasil, ocupando o seu lote na colônia, a família experimentou agruras diferentes e uma tenaz luta pela sobrevivência. Na sua terra, área que depois viria a pertencer à Vila de São João do Monte Negro, passaram a enfrentar a resistência indígena. E assim, em 1847 começa a história de “Luiz Bugre”, apelido que recebeu dos colonos. Diversos ataques dos bugres aconteceram. Eles não apenas devastavam as plantações, mas também lhes pilhavam o gado. Os moradores decidiram, então, organizar um plano: Ao primeiro indício dos indígenas, os colonos seriam imediatamente avisados e os receberiam a espingarda: com sal ou chumbinhos e dariam-lhes uma recordação, inesquecível.
Num determinado dia o alarme foi dado e os vizinhos reunidos. Os colonos rapidamente dispuseram-se em linha de ataque. Para impedir a inopinada evasão da horda que de nada suspeitava, cercaram-na em sem-circulo, protegidos pela densa folhagem da mata. Tudo em silêncio. De improviso um grito, logo dezenas de berros de mistura com as deflagrações dos rifles temidos. Indizível o pânico que subjugou os índios. Fugiram tropeçando, caindo, derrubando-se mutuamente. Voaram morro abaixo e no vale se jogaram nas águas tranquilas do Caí e desapareceram. Um menino indígena (11 anos de idade), foi atingido no joelho, impossibilitando sua fuga e acabou prisioneiro. Esse índio foi acolhido por Matias Rodrigues da Fonseca, de origem portuguesa, mas firmemente integrado à colônia alemã. Dois anos depois, em 1949, foi batizado na religião católica, como Luís Antônio da Silva Lima e ganhou o apelido de “Luiz Bugre”. Aprendeu o português e o alemão, mas jamais conseguiu integrar-se plenamente ao viver dos colonizadores.
Sombrio e taciturno, encontrava na mata, no “habitat” natural; em contato com a natureza encontrava força de viver e compartilhar as coisas do civilizado. Sua mágoa aflorava constantemente e, no avançar da idade, o seu comportamento foi mudando. Daqui continuaremos na próxima semana.

Fonte: Facebook e Coluna no Jornal O Progresso de  24 de novembro de 2017.

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